A solidão é o preço que temos de pagar por termos nascido neste período moderno, tão cheio de liberdade, de independência e do nosso próprio egoísmo.
– Soseki Natsume
A palavra solidão nos remete à ideia de um sentimento no qual uma pessoa sente profunda sensação de vazio e isolamento. Esse sentimento é tomado não só pelo desejo de querer uma companhia ou querer realizar alguma atividade com outra pessoa, mas também, pelo desejo de que os seus sentimentos precisam de algo novo, possibilitando uma transformação em si mesmo.
Durante nosso crescimento como seres humanos e como indivíduos, passamos por um processo de separação ainda no nascimento. A partir de então, continuamos a sofrer diversas formas de separação, perdas e lutos que nos possibilitam ter uma independência crescente até a idade adulta e posteriormente.
Sentir-se sozinho pode ser uma emoção saudável e escolher de ficar sozinho por um período pode ser uma experiência enriquecedora. No entanto, a solidão pode gerar um estado de profunda separação, causando sentimentos de abandono, rejeição, insegurança, ansiedade, falta de esperança, inutilidade, insignificância e ressentimento. Quanto maior o período de tais sentimentos, mais debilitada e travada a pessoa será na capacidade de ter um estilo de vida e relacionamentos saudáveis. Assim, a partir do momento em que alguém se convence de que não pode ser amado, a experiência de sofrimento e o distanciamento do contato social só tendem a aumentar, recorrendo-se muitas vezes ao mundo virtual.
Com a chegada da globalização, com a explosão de informações percorrendo o mundo a cada segundo, com a crescente busca pelos sites de relacionamento social e com tantas outras coisas acontecendo ao mesmo tempo, o ser humano não dá conta de absorver tanta tecnologia e informação, vivendo superficialmente cada coisa. Em outras palavras, há uma diminuição significativa de um elemento essencial à constituição humana: o símbolo. Essa disfunção da função simbólica produz uma anemia psíquica que tem como consequência um estado de vazio existencial caracterizado pelo tédio e pela apatia, causadores de dor e tristeza.
A função simbólica permite ao indivíduo certo grau de intolerância a algo que não lhe faz sentido e concede a ele tempo para elaborar e dar o devido sentido. Acontece que, na atualidade, vivemos um mundo do imediatismo, as pessoas já não tem mais tempo de esperar e tudo é para ontem. Apenas para ilustrar, podemos pensar no exemplo da fotografia. No passado, ao tirar uma foto, era necessário esperar que se terminasse todo um rolo de filme, para então levar a foto para ser revelada e, depois de alguns dias, sim, era possível ver como ficou. Hoje, com a tecnologia, a rapidez em que se tira uma foto e a disponibilidade de visualizá-la é incomparável. Pensando ainda na fotografia, antes, quando alguém nos visitava em nossas casas, parte da visita era para mostrar álbuns de fotografias. As pessoas sentavam para ver as fotos e conversavam. Hoje, o que acontece é uma mera transmissão de dados digitais, as fotos são enviadas por e-mails ou mesmo postadas em sites de relacionamento social.
Com tanta mudança, pode-se dizer que as pessoas estão sendo fragilizadas em seu narcisismo e por isso há um desamparo identitário. Quanto mais frágeis, maior a busca por formas de compensar esse vazio, seja por meio de substâncias psicoativas ou por meio de ações que dão a aparente ilusão de pertencimento à alguma tribo, isto é, o sujeito toma emprestado da cultura elementos – signos – que são usados como tijolos na construção de uma identidade despersonalizada e exteriorizada. Para exemplificar, podemos falar de consumismo, uso de tatuagem e piercing e de sites de relacionamento social que, quando não podem ser dispensados, tornam-se patológicos.
Nesta multiplicidade de coisas, as pessoas parecem que estão se “coisificando”, buscando a felicidade nas “coisas” fora de si e, como a felicidade não está lá fora, perdem-se num mundo mutante e incompreensível. Isolam-se em seus mundos virtuais, vivendo uma identidade superficial, exteriorizada e reificada.
Sendo assim, o que pensar deste mundo globalizado, mundo da informação? Cabe a cada um criar a coragem de olhar para dentro de si e se descobrir, reconhecer suas origens, sua história, seu verdadeiro “eu” e, a partir de então, construir um novo rumo para si, sendo o único responsável por si mesmo, autor de sua própria história.
Para concluir, faço minhas as palavras de Forbes no vídeo a seguir:
Eu nascia na surpresa, agora, na previsão;
Eu não saia de casa, agora, vou para a creche;
Eu namorava alguém, agora, estou ficando;
Eu decorava tudo, agora, uso o Google;
Eu jantava na hora da família, agora, do microondas;
Eu fazia passeata, agora, nem serenata;
Eu escolhia uma faculdade, agora, estudo em várias;
Eu queria ser doutor, agora, inventor;
Eu saía de casa cedo, agora, sou canguru;
Eu casava lá pelos vinte, agora, quase aos quarenta;
Eu jamais me separava, agora, só divorcio;
Eu me aposentava aos cinquenta, agora, mudo de profissão;
Eu morria aos setenta, agora, tenho morte lenta.
E se alguém me perguntar o que eu vou fazer agora, antes, por favor, me responda:
Eu não saia de casa, agora, vou para a creche;
Eu namorava alguém, agora, estou ficando;
Eu decorava tudo, agora, uso o Google;
Eu jantava na hora da família, agora, do microondas;
Eu fazia passeata, agora, nem serenata;
Eu escolhia uma faculdade, agora, estudo em várias;
Eu queria ser doutor, agora, inventor;
Eu saía de casa cedo, agora, sou canguru;
Eu casava lá pelos vinte, agora, quase aos quarenta;
Eu jamais me separava, agora, só divorcio;
Eu me aposentava aos cinquenta, agora, mudo de profissão;
Eu morria aos setenta, agora, tenho morte lenta.
E se alguém me perguntar o que eu vou fazer agora, antes, por favor, me responda:
- Afinal, que raios é a globalização?
Texto: Renne S. Nunes
Psicólogo
Fonte Video - Jorge Forbes: "Afinal, que raio é a globalização?" : YouTube
Fonte de Imagens: Google Image